Sobre o objetivo deste blog.

Os textos a serem postados aqui neste blog se referirão sobremodo ao campo da clínica (da psicoterapia e da técnica) e suas interfaces, tais quais, a arte (literatura e cinema) e o social (política e subjetividade). O objetivo deste blog é servir como um meio de informação acerca da relevância e viabilidade do processo psicoterápico, bem como levar à reflexão acerca da contemporaneidade através do arcabouço teórico psicanalítico.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Notas sobre o que é e o que não é psicoterapia.


O Terapeuta - René Magritte.
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O que não é psicologia clínica (ou psicoterapia)

 Pode-se dizer que uma troca de informações, ainda que significativa e produtiva, sendo ocasional ou esporádica não constitui uma experiência psicológica clínica. Se esta troca de informações apenas reforça ou distorce modelos de funcionamentos mentais preexistentes que resulta numa persistência ou acréscimo de sofrimento (ansiedade e sintomas) permanentes, também não se pode falar em psicologia clínica. Ainda quando essa troca de informações, mesmo que duradoura, não propocia nenhuma transformação em seus participantes, não se trata de uma psicologia clínica, de uma psicoterapia. 

 Diante destes critérios (falta de periodicidade, perpetuação e agudização do sofrimento e inexistência da transformação subjetiva), decorre-se uma série de encaminhamentos sobre o que não é psicologia clínica. A exemplo, a farmacologia se situa numa intervenção que busca uma mudança no funcionamento fisiológico do indivíduo, através de medicamentos cujos mecanismos de ação interferem nos receptores, transmissores, bloqueadores, inibidores químicos etc. O que conta na farmacologia é o substrato orgânico e, assim, uma visão da intervenção que tem como modelo um conjunto pré-dado de medicamentos e suas ações. Já na psicologia clínica, o que está em jogo não é essa generalização, mas a presença da singularidade de um sujeito específico, sua história de vida particular. Assim, uma atuação medicamentosa pode acontecer (e em certos casos deve) em paralelo à atuação psicoterápica, mas elas não se confudem. 

 Ainda que a acentuação do sofrimento não seja uma marca da experiência psicológica clínica, não se pode dizer que toda e qualquer intervenção que visa amansar o sofrimento é automaticamente psicologia clínica. A intervenção de um padre tem como objetivo aliviar o sofrimento propondo uma penitência tarifária específica como forma de prestação de contas diante da justiça divina, uma massoterapia objetiva reduzir a tensão através de uma incidência no corpo individual, uma cartomante alivia a ansiedade através de uma previsão do futuro e decifração do presente, um grande amigo fornece o ombro para o choro e as lamentações provocando sensação de conforto e alívio após um desabafo. Todas essas ações, apesar de diminuírem momentaneamente o sofrimento, não fazem parte, de modo algum, de uma psicoterapia.  

 Essas precisões terminológicas e técnicas podem ter um efeito contrário, ou seja, pôr o psicólogo clínico num lugar místico, como um tipo de profissional que faz diferente de todo mundo. Essa é uma verdade mentirosa. De fato, o psicólogo clínico possui um arsenal metodológico singular e isso certifica a afirmação de que um psicólogo faz diferente de todos os outros que dizem lidar com o sofrimento subjetivo. Por outro lado, não é verdade que o psicólogo é um mago, alguém que, num passe de mágica, num truque, pode desvendar a verdade de cada um, o diagnóstico imutável pertencente a mais profunda camada do ser.

 O psicoterapeuta não é nem atua como um padre, um médico, um farmacólogo, um grande amigo, uma habilidosa cartomante. Então, o que é psicologia clínica? No que consiste essa prática?

O que é psicologia clínica (ou psicoterapia)

 Partindo-se da negativa anteriormente exposta, depreendem-se alguns primeiros passos do que é psicologia clínica: um encontro periódico, reorganização do sofrimento psíquico que via de regra resulta na diminuição de sintomas e conseqüente transformação subjetiva/mudança de posicionamento. 

 O que há de comum da psicologia clínica com as outras práticas supracitadas (padre, cartomante, amigo etc.) é que ela atua na forma de uma relação entre dois sujeitos (ou mais, no caso da psicoterapia de grupo). No entanto, essa relação é ancorada numa técnica e num método sistemático proveniente da abordagem específica escolhida. Essa característica da psicologia clínica não a coloca necessariamente ao lado das doutrinas positivistas inseridas na farmacologia e psiquiatria. O método da psicologia clínica não é algo duro e/ou estático, mas um método que cria condições para uma experiência que se dá no interior de um setting terapêutico. 

Todo terapeuta trabalha com um referencial teórico que é o suporte para sua intervenção na situação psicoterápica . Esse suporte contém uma visão de mundo, de homem, de sofrimento, de cura, de intervenção. Não obstante a diversidade do campo psicológico que resulta numa pluralidade de abordagens (behaviorismo, psicanálise, humanismo, psicodrama, dentre outras), o fio condutor que une e demarca esse campo de dispersão própria da psicologia é o trato com a dimensão da subjetividade a partir de uma corrente psicológica.

 Resumidamente, a psicologia clínica é uma prática alicerçada numa teoria que fundamenta a intervenção; um tratamento que tem um período que resulta no alívio do sofrimento através de uma mudança subjetiva. 


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